O Esquema de Macron

Informações e reflexões que venho recolhendo entre amigos no exterior, inclusive diplomatas estrangeiros, sobre a crise das queimadas na Amazônia, são, a meu ver, preocupantes e dignas de divulgação. Eis um resumo:

– O presidente da França valeu-se, efetivamente, das queimadas como pretexto para boicotar o acordo de comércio entre o Mercosul e a União Europeia, no intuito de proteger a agricultura francesa da concorrência com o pujante agronegócio brasileiro (vide “Os Motivos do Macron”). Embora as queimadas estejam efetivamente mais intensas, superam em apenas 4.564 a média histórica, não são piores do que as que ocorrem no restante da Amazônia sul-americana, na África, na Sibéria, nos Estados Unidos ou na Europa e, consequentemente, não justificam o escarcéu promovido por Macron. Até agora, ignora-se que tenham provocado vítimas fatais. Falta ao governo transparência, divulgação de dados atualizados e diplomacia climática.

– As declarações do presidente Bolsonaro sobre meio ambiente e ações, como a ameaça de abandonar o acordo de Paris sobre alterações climáticas, o bloqueio do Fundo da Amazônia e a exoneração do diretor do Inpe, estariam sendo monitoradas, há meses, pelo governo francês, com ampla divulgação na imprensa, a fim de utilizá-las, como as utilizou, para tentar comover a comunidade internacional quanto ao destino da Amazônia em mãos de pessoa, segundo os franceses, inábil para governá-la.

– No “Easy Rider” internacional, a parceria com Donald Trump não parece ser a ideal, tendo em vista suas condutas erráticas e seus posicionamentos com respeito ao meio ambiente, concretizados através da retirada dos Estados Unidos do referido Acordo de Paris. Enfrenta, ademais, acusações de desrespeito aos direitos humanos no que se refere ao tratamento dispensado a imigrantes ilegais e suas famílias, sobretudo crianças.

– Macron não estaria interessado na internacionalização da Amazônia, medida extrema, que mexeria com a soberania de oito países. Não há organização mundial, nem as Nacões Unidas, disposta a geri-la. O esquema seria propor, caso encontre apoio (atualmente, conta apenas com Finlândia e Irlanda) e eco a seus argumentos, no âmbito de um grupo de países (G?), da União Europeia ou da ONU, um acordo de redução de queimadas na Amazônia, a exemplo do acordo de redução de enriquecimento de urânio firmado entre o Irã e o G5+1 (Alemanha, China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia) ao qual o Brasil aderiria sob ameaça de boicote às suas exportações. O acordo incluiria inspeções internacionais periódicas, a fim de acessar a situação do bioma, propor medidas ou sanções, em caso de descumprimento de metas.

– Macron parece estar, até o presente momento, isolado. Por enquanto, o G7, que ignorou suas propostas mais radicais, anunciou que apresentará na ONU, em setembro, um projeto de reflorestamento da Amazônia. Se, no entanto, a proposta de Macron for submetida à organização e aceita, os resultados são difíceis de prever, diante das manifestações de 193 países com interesses e agendas diversas. A França, que é membro permanente do conselho de segurança, possui sua claque na ONU, inclusive entre nações africanas que poderiam ser convencidas a aceitar semelhante acordo, mediante ajuda financeira internacional.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *