Crescimento econômico na Guiana e oportunidades para o Brasil.

Palestra ministrada na Associação PanAmazônia, em 25 de março de 2021

Em primeiro lugar, quero agradecer ao Dr. Belisário Arce pelo convite para participar desta live.  Cumprimento também os demais participantes e quero dizer da minha satisfação de reencontrar, depois de tantos anos, o Dr. Remídio Monai, Presidente da Câmara de Comércio Brasil-Guiana.  

Espero que a minha experiência de 4 anos como Embaixador do Brasil em Georgetown possa enriquecer este diálogo.

As Guianas podem ser consideradas pontos isolados fora da curva no continente sul-americano.  Isso porque foram, até meados do século passado,  territórios europeus não autônomos incrustados na América do Sul, inclusive com idiomas distintos aos falados pelo Brasil e demais países hispânicos. Assim, as relações diplomáticas do Brasil com as Guianas eram conduzidas através das respectivas metrópoles, como, aliás, continuam sendo até hoje, no que diz respeito à Guiana Francesa.  Esse panorama se modifica a partir de 1966 e 1975, com as independências, respectivamente, da Guiana e do Suriname. A ex-Guiana inglesa surge, desde logo, como a mais promissora entre as três Guianas e sua relevância decorre do fato de que, no plano internacional, ela se apoia no  tripé representado 

– pela Commonwealth, ou Comunidade Britânica de Nações, da qual ela participa; 

– pelos organismos e iniciativas regionais americanos, como a Organização dos Estados Americanos (OEA); 

– e, no que mais nos interessa, pelo Caricom, ou Comunidade do Caribe, da qual Georgetown é sede, o que a coloca Guiana numa posição privilegiada como via natural de escoamento  das exportações do Amazonas, de Roraima e até de outros Estados do Norte do Brasil para os Estados Unidos, o México e o Caribe, bem como para mercados acessíveis através do Canal do Panamá.

A Guiana desponta, assim, como um parceiro importante, não só no que diz respeito à obtenção de votos favoráveis ao Brasil em foros internacionais – foi um dos primeiros países, por exemplo, a apoiar o Brasil na pretensão de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas – como constitui a melhor opção, inclusive do ponto de vista  geográfico, para a implementação de um projeto de aproximação e integração com as Guianas.  A principal dificuldade na consecução de tal objetivo reside, contudo, no fato de que os interesses da Guiana sempre estiveram voltados para o hemisfério norte. Seria necessário, portanto, provocar uma espécie de “meia volta, volver”, que trouxesse benefícios mútuos para ambas as nações.   Aqui, cumpre fazer um “mea culpa”, no sentido de que os esforços do Governo Brasileiro para atrair a Guiana têm sido intermitentes e esporádicos. 

Felizmente, coube à minha gestão à frente da Embaixada em Georgetown implementar uma dessas fases de maior aproximação, o que poderia ser resumido da seguinte maneira: 

  • Proteção e apoio à comunidade brasileira na Guiana, composta sobretudo de mineradores; trata-se de providência importante, pois não há aproximação ou integração possíveis sem que os nacionais de um país se sintam satisfeitos e seguros no outro;
  • A manutenção em condições de trafegabilidade do trecho Lethem-Linden da estrada Boa Vista-Georgetown; caso os senhores queiram mais detalhes sobre a ação desenvolvida, recomendo a leitura da  matéria “Missão na Guiana: Acesso Viário ao Brasil, Iwokrama e Internacionalização da Amazônia” que republiquei recentemente no blog www.passealimpo.com.br;
  • O afastamento dos óbices para a finalização da obra da ponte sobre o Rio Tacutu; infelizmente, a construção não foi concluída antes do término da minha missão em Georgetown, razão pela qual não pude inaugurá-la;
  • A assinatura, em junho de 2001, do Acordo de Comércio Brasil-Guiana (Acordo de Alcance Parcial e Complementação Econômica nº 38, no âmbito na Associação Latino-Americana de Integração (ALADI); desconheço a atual situação do acordo, se foi ampliado ou não, mas sei que, em 2016, o comércio bilateral com a Guiana, foi da ordem de US$ 31,8 milhões, sendo US$ 25,8 milhões de exportações e US$ 5,9 milhões de importações; é possível que os senhores tenham dados mais atualizados; de qualquer forma, é um montante insignificante e estruturalmente desequilibrado; portanto, um vasto campo a ser explorado; tenho entendido, ademais,  que Brasil e a Guiana firmaram, em 2018, um Acordo de Cooperação e Facilitação de Investimentos; 
  • Finalmente, a eliminação da obrigatoriedade de vistos de turismo para nacionais dos dois países; durante a minha gestão, implementei várias campanhas de promoção de turismo no Amazonas e em Roraima e liderei a visita de dois grupos de empresários guianenses a Manaus, grupos que, depois, se multiplicaram. 

Esta me parece, em resumo, uma pauta que, atualizada e ampliada, poderia servir de base para a integração com a Guina, cujo desenvolvimento econômico não pode ser ignorado pelos Governos e setores privados dos Estados do Amazonas e de Roraima.  Fala-se de um Dubai da América do Sul e o Produto Interno Bruto da Guiana, nos próximos anos, deverá ser uma maiores da região.  Assim, 

  • Em primeiro lugar, eu diria que Roraima é a porta de entrada para a Guiana; nesse contexto, a coordenação de esforços entre o Amazonas e Roraima é imprescindível, assim como a conclusão e o asfaltamento do trecho Lethem-Linden da estrada Boa Vista-Georgetown é essencial; a propósito, acordo firmado, em 2017, prevê que o Brasil apoie, por meio de projeto de engenharia, a pavimentação do trecho; me parece pouco e, pelo que eu sei, esse projeto já existe, elaborado pelo Departamento de Engenharia do Exército; por outro lado, o empreendimento tem recebido o apoio do Ministro Paulo Guedes, no sentido de buscar financiamento junto ao BNDES;  os senhores certamente poderão me atualizar a respeito;
  • Para completar a integração física, seria necessário, ainda, estabelecer voos comerciais regulares entre Manaus, Boa Vista e Georgetown; na minha época, a Meta, do saudoso Comandante Mesquita, voava para Georgetown e Paramaribo;
  • Igualmente importante seria a ampliação, em busca de novas oportunidades, dos acordos de comércio, complementação econômica e facilitação de investimentos já existentes, bem como a firma e aperfeiçoamento de outros, por exemplo, nas  áreas de mineração, da agricultura e de transportes terrestres;
  • Finalmente, convém  não esquecer a importância do turismo para a sedimentação de qualquer projeto de integração; nesse sentido, os Governos e setores privados do Amazonas e de Roraima necessitam investir pesadamente em campanhas de promoção de turismo, a fim de atrair o consumidor guianense, cujo poder aquisitivo passará a ser disputado; 

Senhores, espero ter contribuído com algumas ideias construtivas para um melhor aproveitamento do desenvolvimento da Guiana por parte do Brasil.  Foi um prazer participar deste evento e coloco-me à disposição para responder a eventuais perguntas. Muito obrigado.

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