Os Motivos do Macron

Restam poucas dúvidas de que a crise “internacional” (melhor seria denominá-la “binacional”) das queimadas amazônicas foi fabricada pelo presidente da França, Emmanuel Macron, a fim de escapar do anzol (desculpem a tradução literal do inglês) do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, séria ameaça à cambaleante agricultura francesa que pode ser varrida do mapa pelo nosso agronegócio.  Pois bem, para quem quiser compreender melhor a camisa de sete varas na qual o gaulês está metido, o último romance, SEROTONINA, do francês Michel Houellebecq, cognominado o “profeta do caos”, acaba de ser lançado no Brasil.

O pano de fundo é a catastrófica situação dos agricultores franceses às voltas com as rígidas regulamentações e a burocracia da União Europeia.  É sempre bom lembrar que, se dependesse da UE, o nosso autêntico camembert de cada dia desapareceria, uma vez que  não pode ser produzido com leite pasteurizado (N.B. – segundo o temido acordo, as alíquotas sobre queijos de origem do Mercosul serão eliminadas).  Valendo-se, assim, das dificuldades  criadas pelo bloco europeu, Houellebecq prevê uma inevitável e violenta revolta dos agricultores que equivaleria, mutatis mutandi, à sempre pendente greve dos caminhoneiros brasileiros, a respeito das quais os governos francês e brasileiro, respectivamente, pouco ou nada podem fazer (vide “A Crise dos Caminhoneiros”).

O personagem principal é um consultor bem-sucedido do ministério da agricultura, cuja única companhia é uma ficante que o trai e pratica sexo grupal.  Entre as pressões do trabalho e a relação insólita, o infeliz ingere pastilhas que lhe aumentam o nível de serotonina – origem do título do romance –, mas lhe anulam a libido. Houellebecq insiste, ademais, no tema  da decadência e da acomodação (ignora os “gilets jaunes”) da sociedade francesa, lembrando que seu penúltimo romance, publicado pouco antes do ataque à redação do hebdomadário Charlie, previa a tomada do governo da França por um partido islâmico radical que praticava uma série de violências, razão do cognome acima mencionado.  Mais não direi, pois não quero ser spoiler.

 

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