Quando eu estagiava, como Cadete, no 3º Regimento de Infantaria, então sediado em Niterói, havia um companheiro que se dirigia aos palavrões ao seu Pelotão. Era de fdp a “carvalho” (caralho, no fino linguajar de Bolsonaro). Diante do mal-estar da soldadesca, inclusive daqueles que tinham uma certa dificuldade em ter suas mães insultadas diariamente, foi admoestado diante dos colegas pelo comandante da Companhia, um Capitão, que, entre outras coisas, ordenou-lhe que tivesse compostura, pois “você não está na sua casa!”, onde intuiu que esse palavreado seria corriqueiro e aceito. Lembrou-lhe que era instrutor numa unidade do Exército Brasileiro, onde educação e disciplina eram a ordem do dia.
Estou, portanto, convencido de que não foi no Exército que Bolsonaro aprendeu a xingar publicamente, conforme o fez, durante jantar com alguns subnotificados (se comparados aos pesos-pesados) do empresariado brasileiro. O ofendido foi o Governador de São Paulo, onde, aliás, o jantar se realizou, e que, em resposta, anunciou que iria vaciná-lo contra hidrofobia. O lamentável é que Bolsonaro não tem sequer o charme dos bocas-sujas que sabem emitir um palavrão no local e hora apropriados. A baixaria foi tanta que, ao me considerar um cavalheiro, sem prejuízo de ser feminista, me alegro com a ausência de mulheres no recinto, exceção feita à desafortunada que, na entrada, tomava a temperatura dos convivas.
Reitero minha convicção de que não adianta nomear ou trocar Ministros, a fim de melhorar o desempenho do governo, uma vez que Bolsonaro ocupa todas as pastas da Esplanada dos Ministérios. Todas têm a sua cara. Assim, não há vivalma que possa melhorar a sua imagem, nem o Ministro da Comunicações, Fábio Faria, cuja única credencial como comunicador é ser genro do Sílvio Santos. Deveria saber o perigo que corre, ao convocar, em nome do Presidente da República, políticos e empresários para eventos, sob pena de irritar os que não foram convocados. O tiro saiu, assim, pela culatra, ao reunir um grupo seleto que, de qualquer forma, já apoiava Bolsonaro. Ninguém foi convertido ao bolsonarismo. O máximo que a turma obteve, ao aplaudir sua atuação claudicante no combate ao vírus, foi identificar-se com Bolsonaro como agente da escalada pandêmica. Enfim, não compreendo como Bolsonaro continua a ser o “mito” de pessoas educadas e cultas, como algumas que estavam presentes.
O fenômeno só pode ser atribuído a algum mecanismo psicológico de compensação. De fato, conversando com um amigo, médio empresário bem-sucedido do Vale do Itajaí, ele me confessou, ao comentarmos o famoso jantar, que Bolsonaro o atraia pelo fato de que mandava tomar do c* pessoas que também o desagradavam. Pareceu-me justificativa insuficiente para apoiar um Presidente da República, mas admito que Bolsonaro serve de válvula de escape diante das atuais dificuldades, mas somente para os poucos que ainda não o reconhecem como o principal responsável pela catástrofe sanitária e econômica que nos assola. Espera-se que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia, caso seja efetivamente instalada, jogue finalmente alguma luz sobre a matéria.